Juíza julga incompatível com a constituição federal artigo do código de processo penal
Uma decisão incongruente ou acertada?
A juíza Placidina Pires, da 10ª Vara Criminal de Goiânia, indeferiu requerimento formulado por defesa técnica de réu, para apresentar suas razões recursais na instância superior, julgando que o artigo 600, parágrafo 4º, do Código de Processo Penal, é incompatível com a Constituição Federal de 1988. A magistrada disse que a norma processual colide com o princípio da duração razoável do processo, informando que o Pacto de San José da Costa Rica prevê a celeridade processual como um Direito Humano Fundamental.
O artigo 600, parágrafo 4º, do Código de Processo Penal, permite à defesa apresentar suas razões recursais no 2º grau. A juíza verificou que o legislador, ao propor a legislação, buscou facilitar a defesa dos réus, devido ao reduzido contingente de advogados, grande parte concentrada nas capitais, os quais tinham dificuldade de protocolizar as suas razões ao recurso diretamente no juízo de primeiro grau. Buscou, também, evitar que os defensores ficassem constrangidos de indicar, perante juízo de primeiro grau, as razões para a pretendida reforma da decisão judicial recorrida.
Porém, Placidina Pires disse que esta norma é de 1964, introduzida por meio da Lei n 4336/64, quando ainda não existiam os atuais mecanismos de transmissão de dados, documentos e petições. Explicou que, atualmente, a defesa consegue protocolizar suas petições e razões recursais em qualquer fórum do Estado, sem necessidade de deslocamento, não precisando, nem mesmo, sair de seu escritório.
Ademais, afirmou ser descabido "o receio dos defensores de indicarem perante o juízo de primeiro grau as suas razões recursais, mormente porque não existe subordinação entre advogados e magistrados, de modo a sustentar a alegação de constrangimento, e, também, porque, o juiz, mais cedo ou mais tarde, tomará conhecimento dos argumentos utilizados pelo apelante em seu recurso, já que os autos, após as razões ofertadas perante a superior instância, retornarão à origem para as contrarrazões da parte contrária. Ou seja, de nada adianta esse receio dos advogados".
Celeridade Processual
“Constatei que, em vez de benefícios, a referida norma processual, que sequer foi mencionada no projeto de lei do novo Código de Processo Penal, representa verdadeiro empecilho à celeridade e à efetividade da prestação jurisdicional, em evidente afronta ao princípio constitucional da duração razoável do processo, estatuído no artigo 5º, inciso LXXVIII, da Constituição Federal”, disse Placidina Pires. Esclareceu que, como consequência do princípio da duração razoável do processo, aquele que se encontra preso ou sujeito a medida privativa de liberdade, é garantido o direito público subjetivo de ser julgado dentro de um prazo razoável, sem retardamentos abusivos, desnecessários e injustificáveis. Por fim, disse que tal norma acaba por tornar a marcha processual ainda mais lenta, impondo custos desnecessários ao erário.
"A meu ver, referida manobra, que tem por objetivo unicamente possibilitar ao apelante moldar as suas razões ao posicionamento dos integrantes da turma ou câmara a quem couber o julgamento do recurso, por sacrificar a celeridade processual e impor gastos ao erário, configura afrontoso abuso de direito de defesa, que deve ser energicamente coibido. Nesse descortino, necessário reconhecer a incompatibilidade do § 4º, do artigo 600, do Código de Processo Penal, não apenas com a Constituição Federal, mas também com os tratados internacionais de direitos humanos ratificados pelo Brasil", concluiu a magistrada. ( Autos nº 2016.0372.7625 ).
Considerações: Não obstante a decisão da nobre juíza, depreende-se, em tese, que a decisão foi proferida inobservando o disposto do artigo: 97 da CF/88 e da Súmula vinculante nº 10 do STF. Por outro lado, tenho que concordar com a decisão da nobre juíza, pois não há nenhuma justificativa plausível para enviar os autos para tribunal sem as devidas razões do recurso. A regra do artigo: 600 § 4º do CPP, permite, após recebido o recurso de apelação, as razões poderão ser apresentadas na 2º instância.
Eis a grande questão relativa a morosidade e/ou postergação. Apresentada as razões do recurso na 2º instância, os autos são remetidos para o juiz de origem para que seja aberto prazo para apresentação das contrarrazões pelo promotor de Justiça que atua perante a respectiva vara criminal. Conforme ponderou a nobre juíza, não há realmente justificativa para o envio dos autos ao tribunal sem as razões recursais, o que consiste em uma grande perda de tempo, principalmente, com o advento do processo judicial eletrônico.
O cerne da questão combatido na decisão da nobre juíza, consiste em evitar a denominada morosidade dos julgamentos nas instâncias superiores, mesmo que a decisão venha desagradar alguns, não se pode olvidar, a morosidade dos julgamentos constitui uma das maiores reclamações da população em relação ao Poder Judiciário, pois a morosidade em grande parte, favorece a impunidade dos réus. Vejo por esta ótica que a decisão da magistrada foi acertada, tendo como supedâneo, o disposto do artigo 5º, inciso LXXVIII da CF/88.
Fonte: Centro de Comunicação Social do TJGO. Autos nº 2016.0372.7625.
3 Comentários
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Vejo que o texto demonstra a evolução do direito e o resultado natural desta evolução, não vou entrar no pano de fundo da matéria por falta de conhecimento técnico na área. continuar lendo
Matéria interessante, isto já se tornou uma regra geral ou dependem do caso concreto, pois a decisão foi no Estado de Goiás, não me lembro de ver em outro lugar. continuar lendo
Nobre colega, já houve uma decisão semelhante no Paraná, apesar da norma se encontrar vigente, alguns juízes estão considerando-a incompatível. Na minha opinião, esta norma só serve para protelar e favorecer os denominados réus do colarinho branco, retardando o desfecho final da ação, tendo como objetivo, fins escusos. A medida não ofende o sagrado direito de defesa, portanto, a decisão é valida em favor da celeridade processual. A defesa do Lula deve ficar atenta, não vai conseguir postergar a tramitação da ação penal na fase recursal. A decisão que adotou a mesma linha da juíza foi de um colegiado do Tribunal do Paraná. continuar lendo